Resenha: No Início não Havia Bob

by - 10 julho

Resenha por Brunna Carolinne

Autora: Meg Rosoff
Editora: Galera Record
Número de páginas: 240

Mona, deusa de uma galáxia distante, ganha a Terra em um jogo de pôquer e decide colocá-la sob os cuidados do filho mimado, preguiçoso e que tem os hormônios em constante euforia - Bob. O garoto, que é um típico adolescente, simplesmente cria tudo em 6 dias e a partir daí joga toda e qualquer responsabilidade para cima de seu assistente, o frustado Sr. B.
Quem faz todo trabalho pesado da Terra é o Sr. B, enquanto Bob recebe todo o crédito. Isso é tão injusto! O garoto só sabe dormir e correr atrás de garotas humanas. Aliás, a escolhida da vez é Lucy, uma moça adorável que trabalha em um zoológico e sonha com o amor perfeito. É claro que isso não vai dar nada certo. Bob não sabe interagir nem com os seres imortais iguais a ele, imagine com os mortais que foram criados à sua imagem e semelhança.
Entre desavenças com pessoas intolerantes, gananciosas e mesquinhas, os sentimentos de Bob vão bagunçando todo o planeta, afinal, este é afetado pelas emoções do criador. E vai sobrar para quem resolver tudo? O Sr. B, óbvio. Mas os poderes dele são bem limitados. Como conter o poder de Deus?
Nunca li nada remotamente parecido com No Início não Havia Bob. Comecei a leitura sem expectativas, não sabia nem mesmo o que esperar de uma obra com essa premissa de Deus adolescente apaixonado. Então, quando as primeiras páginas mostraram uma narrativa em terceira pessoa bastante poética, com muita personalidade, fiquei logo animada. Mas essa sensação não perdurou por muito tempo.
O primeiro detalhe que começou a me incomodar foi o que eu chamo de mudança de foco. Deixa eu tentar explicar: a narrativa é em terceira pessoa, mas ela não se concentra em um único personagem. Os acontecimentos, pensamentos e íntimas emoções são contados pelo ponto de vista de diversos personagens. Em um momento, a narração é feita com foco em Bob, dizendo onde ele está, o que está fazendo e sentindo, mas, do nada, sem nenhuma indicação para o leitor se preparar, ela simplesmente muda para o Sr. B, por exemplo, onde quer que este esteja, passando a dar toda a atenção da narrativa para ele. Isso me deixava bastante confusa, pois a mudança acontecia muito rápido e eu não conseguia acompanhar.
A constante aparição de novos personagens também me deixou bem desorientada, até porque, logo que eles surgiam, não era feita uma apresentação de cada um, explicando quem eles eram e qual a ligação deles com os demais e com a história em si. Além do fato de ser mais personagens para a narração conseguir dar foco.
Um pouco mais perto do desfecho, uma história paralela parece ganhar mais importância que a suposta principal. O drama que envolve um animal raro que é apostado e será comido ganha mais espaço que todo o resto. O que aconteceu? O rumo foi alterado assim do nada por quê?
Nem sei o que dizer sobre o final, a não ser: não tem final! Só alguns detalhes ganharam solução, foram amarradinhos (de maneiras bem sem noção, diga-se de passagem); outros simplesmente foram deixados de lado, sequer foram mencionados novamente. Juro que cheguei a pensar que esse era o primeiro livro de uma série, mas após pesquisar um pouco, descobri que é livro único mesmo. 
Preciso destacar a originalidade, criatividade e ousadia da autora. Quando se toca em qualquer coisa relacionada a religião, é preciso ter coragem, e isso com certeza Rosoff teve, ainda mais porque ela descaracterizou radicalmente a figura de Deus. Há até um tanto de consistência no pensamento da escritora, pois certamente muitos pensam: "Deus se importa mesmo? Cadê ele?". Ponto também para os personagens bem distintos que foram criados, ainda que não profundamente desenvolvidos (com exceção de dois ou três).
Eu me pergunto: qual era a intenção da autora ao escrever No Início não Havia Bob? Queria fazer os leitores refletirem? Queria chocar? Causar debates? Ou somente criar uma história bem inovadora? Se for algum desejo parecido com esses, então okay, conseguiu. Mas uma pena que tudo isso se perdeu em meio a um enredo que não envolve o leitor, muito pelo contrário, causa antipatia por conta de evidentes deslizes.
"- Talvez a forma de proceder seja pensar na vida na Terra como uma piada colossal, uma criação de uma estupidez tão imensa que a única forma de viver é rir até achar que nosso coração vai se partir. (...)"
pág. 225

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